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  • Johanna Kantola e Emanuela Lombardo

COMO AS PERSPECTIVAS DE GÊNERO TRANSFORMARAM A CIÊNCIA POLÍTICA?



As perspectivas de gênero transformaram a ciência política. Mas quais são as principais contribuições dos estudos de gênero e política para a disciplina?


Em primeiro lugar, como Brooke Ackerly e Jacqui True afirmam corretamente, "a análise de gênero abre todo um cenário de novas questões de pesquisa, bem como nos dá ferramentas para repensar velhas questões de pesquisa" de poder, instituições, agência e democracia. Por exemplo, as crises econômicas têm impactos de gênero. Mas a pesquisa feminista poderosamente mostra que compreender a posição particularmente frágil das mulheres negras e de minorias étnicas - seu estado permanente de crise - pode requerer que repensemos todo o conceito de “crise”.


Em segundo lugar, as análises políticas feministas oferecem uma ampla gama de perspectivas. Elas variam de uma abordagem das mulheres (investigando a representação das mulheres em instituições políticas), a uma abordagem de gênero (explorando as estruturas e práticas preconceituosas de gênero dentro das instituições), uma abordagem de desconstrução de gênero (analisando a construção do gênero nos discursos políticos e seus efeitos nas pessoas), uma abordagem interseccional (estudando a interação de gênero com outras desigualdades) e uma abordagem pós-desconstrução da abordagem de gênero (como os novos estudos materialistas).


Cada abordagem captura aspectos da realidade política que outras perspectivas podem ter negligenciado e, em conjunto, lançam luz sobre dimensões de poder e desigualdades que os estudos políticos cegos ao gênero tendem a subestimar.


Terceiro, as análises de gênero expandiram as fronteiras do "político" para incluir as relações e questões de gênero antes consideradas privadas. Como mostra o famoso slogan feminista "o pessoal é político", as relações de poder não são abstratas, mas sim incorporadas em assuntos de gênero. Duas consequências principais de conceituar "o político" merecem destaque: a primeira é que as relações de poder e os valores são considerados generificados, porque reproduzem normas de gênero e preconceitos contra as mulheres; a segunda é que as análises de gênero consideram questões anteriormente definidas como pessoais - ou que ainda são de fato marginalizadas na política, apesar de sua inclusão na legislação existente - como a violência sexual ou o cuidado com crianças, como altamente políticas.


Quarto, a pesquisa de gênero e política é especialmente apta a conectar teoria e práxis, algo que a política como disciplina precisa, especialmente em tempos de crise. Os desafios do mundo real fornecem uma série de exemplos práticos e mostram como a teoria da igualdade está envolvida com problemas palpáveis, questionando hierarquias de poder de gênero e sugerindo maneiras de colocar a igualdade na prática cotidiana. Gênero e política tendem a ser conduzidos por meio da teoria e lentes feministas. Esse componente normativo, por um lado, tornou as perspectivas de gênero vulneráveis a críticas de possuírem viés ideológico aos olhos da ciência política dominante. Por outro lado, o lado normativo da análise feminista da política aumenta sua força para explicar, compreender e mudar as relações de dominação que ocorrem nas sociedades existentes.


Em suma, a análise política e de gênero tem muito a oferecer à ciência política. A principal contribuição das abordagens de gênero para a ciência política reside na sua diversidade, pois cada uma delas é capaz de captar aspectos da realidade política que outras perspectivas negligenciam. Por meio de seu adequado reconhecimento acadêmico na disciplina de ciência política, os cientistas podem desfrutar dos benefícios de uma gama mais completa de abordagens analíticas para compreender, explicar e transformar o político.




Este texto é uma versão traduzida e adaptada de “How Have Gender Perspectives Transformed Political Science?”. Agradecemos às autoras por disponibilizar o conteúdo.




Johanna Kantola é Professora de Estudos de Gênero na Tampere University.

Emanuela Lombardo é Professora Associada da Faculdade de Ciência Política e Sociologia da Universidade Complutense de Madrid.

Ambas são autoras de Gender and Political Analysis (2019).

Editora responsável: Marcia Rangel Candido

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